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100 Balas

Assim como Preacher, a série 100 Balas, da linha Vertigo da editora DC Comics, tem passado por uma história de publicação no Brasil cheia de complicações. Enquanto a publicação de números inéditos parou por volta da edição 33, os três primeiros arcos da série ganham sua terceira versão brasileira. No entanto, isso não tira o mérito da série ou das duas editoras que trabalharam com ela no país, a Opera Graphica e, atualmente, a Pixel.

Na verdade, a republicação que a Pixel vem fazendo dos primeiros arcos, em forma de volumes de menos de 100 páginas, com lombada grampeada e papel convencional, tem se mostrado uma excelente oportunidade para os leitores acompanharem a série, pois tem um custo/benefício melhor do que a publicação de edições de 22 páginas e de encadernados de luxo. É grande chance da série emplacar de vez no Brasil.

A revista apresenta uma trama que combina elementos das histórias policiais, conspiração e suspense. O misterioso agente Graves aparece para pessoas de vários cantos dos EUA, que foram prejudicadas de alguma forma,  e oferece uma maleta com recursos para uma vingança: provas, uma arma e cem balas que não podem ser rastreadas pela polícia. As motivações do agente Graves são reveladas mais adiante e mostram que há muito mais por trás destas ofertas de vingança.

Além do enredo muito bem elaborado, o grande atrativo de 100 Balas é a ambientação repleta de violência em que estes personagens de lugares tão distantes e diferentes entre si habitam. O aspecto psicológico dos personagens que recebem a visita do agente Graves é muito bem explorado pelo roteirista Brian Azarello e pelo desenhista Eduardo Risso. As cenas de diálogo são tão impactantes quanto as de ação.

Recentemente, por ocasião da Festa Literária de Parati, o mexicano Guillermo Arriaga, roteirista de filmes como Amores Brutos, 21 Gramas e Babel, indagado sobre a violência presente em seus filmes, disse que ela era completamente diferente da violência que se vê na maioria das produções de Hollywood. Para ele, a violência, em Hollywood, se mostra como um espetáculo que pode ser divertido, como nos filmes de Quentin Tarantino, onde a violência chega a funcionar como paródia do próprio imaginário norte-americano. Já em seus roteiros, que mostram pessoas em condições de vida mais extremas, a violência não é divertida, mas parte de um drama maior.

O mesmo pode ser dito de 100 Balas. Toda galeria de personagens tem que lidar com a violência como uma parte constitutiva de suas vidas, mesmo antes de receberem a oferta do agente Graves e serem envolvidos pela conspiração que atravessa toda a trama. As cenas de ação não servem apenas para chamar a atenção do leitor, mas são uma conseqüência natural desta relação com a violência, que se manifesta de várias formas.

Neste aspecto, 100 Balas se diferencia de Sin City, que tem muito a ver com os filmes de Tarantino – não por acaso ele dirigiu uma das tramas da adaptação para o cinema. Sin City é uma paródia dos pulps com histórias policiais e da estética dos filmes noir, um exercício de imaginação sobre o gênero em si, quase um exercício metalingüístico. Aqui a violência pode ser exagerada e divertida, pois existe somente entre mundos de ficção.

A violência que existe em 100 Balas é a violência que o roteirista Brian Azarello observa nos submundos dos EUA. É algo que faz parte da forma dos personagens se relacionarem, uma parte constitutiva deles próprios. Muitas vezes, a vingança oferecida pelo agente Graves não é o foco do enredo e algumas vezes nem chega a se realizar, mas a violência se mostra no tratamento entre os personagens.

Enquanto as causas da guerra que Graves está travando silenciosamente são reveladas mais vagarosamente, a cada edição o leitor é apresentado a um tipo diferente de traição e desejo de vingança. Com isso, a série consegue fugir dos estereótipos do gênero policial e criar conflitos mais interessantes e com uma carga dramática muito intensa.

 



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