Homem Aranha versão Ultimate


Nos final dos anos 2000 tinha começado a gestão de Joe Quesada como editor chefe da Marvel e junto com o novo presidente da empresa, Bill Jemas, foi decidido que era hora de dar uma repaginada nos seus heróis. Como a maioria dos personagens foi criada na década de 60, eles acumularam uma grande carga de cronologia que muitas vezes afastava novos leitores receosos de não entender a história.

Para resolver isso a editora resolveu que reiniciaria as histórias de seus personagens, atualizando seus conceitos, tornando-os viáveis para o século 21. Mas a Marvel nunca teve o mesmo problema da DC, com diversas Terras em tempo diferentes, então sua cronologia oficial não era um problema, muito pelo contrário ela agradava e muito os fãs tradicionais. Dessa forma, essas mudanças não poderiam ocorrer nas revistas tradicionais. A melhor solução para esse problema foi criar uma realidade paralela, independente das histórias normais, algo do gênero: “O que aconteceria se Perter Parker virasse o Homem-Aranha no ano 2000”. Para iniciar essa linha escolheram os personagens mais vendáveis da editora: O Homem-Aranha e os X-men.

A idéia funcionou melhor do que o previsto. A revista conseguiu arrebatar um novo público e também tornar-se querida entre os fãs antigos que se interessavam por ver as novas versões de personagens e eventos. A partir daí foram surgindo novos personagens e títulos como Marvel Team UP, Supremos e Quarteto Fantástico todos de grande sucesso de crítica e público, principalmente os Supremos, que são a versão dos Vingadores para a era Bush.

O caso do Homem-Aranha, além de ser o primeiro a ser lançado, teve uma peculiaridade interessante: até hoje, próximo a edição número 100 do título, ele só teve uma dupla nos desenhos e roteiros: Mark Bagley e Brian Michael Bendis, escritor que depois seria um dos principais responsáveis por grandes reformulações também na linha tradicional. Essa parceria de sucesso está conseguindo algo raro na indústria atual, que é dar consistência e continuidade tanto aos textos quando à identidade visual da revista. Longas parcerias em um mesmo título eram algo característico dos quadrinhos antes dos ano 90, quando a grande proliferação de estúdios e a produção quase industrial de revistas alterou totalmente a dinâmica criativa das grandes editoras.

Sobre o personagem em si, a essência foi preservada. Ele ainda é um garoto que ganha seus poderes por causa de uma aranha que sofreu alterações genéticas. Ele ainda é um perdedor que, tanto quanto Perter quanto como Aranha, sempre tem um monte de problemas. Ele ainda se responsabiliza pela morte de seu tio. A Mary Jane ainda é a vizinha que se apaixona pelo nerd atrapalhado. Acima de tudo, o Aranha ainda é falastrão, piadista e um herói antes de qualquer coisa.

Então você perguntaria o que mudou. Bem os grandes eventos são mais ou menos os mesmos, os personagens são aqueles que conhecemos, o que é diferente é a forma de contar a história e o desenrolar dos eventos. Nisso que está o grande trunfo de Bendis. Como se deixa interessante uma história que todo mundo sabe o final? Conduzindo muito bem os eventos até esse final e é isso que torna a versão Ultimate tão interessante.

Como se a vida de Peter Parker fosse uma história que todos já conhecem, algo folclórico, Bendis se colocar no lugar de um narrador diferenciado que pretende de fazer vibrar pela enésima vez com a mesma história e ainda assim te causar uma sensação nova. Sabe aquelas crianças que gostam de ouvir toda noite a mesma história antes de dormir? Nada mais infantil e ao mesmo tempo tão sofisticado se transferindo para os quadrinhos.

Obviamente existem algumas adaptações necessárias para atualizar a história. O fluído de teia nessa versão era um dos projetos inacabados do pai de Peter. Ele namora a Mary Jane desde o começo da trama e ela sabe seu segredo. A tia May não é uma velhota tão frágil, saindo para trabalhar e sustentando a casa depois da morte do tio Ben (cabe um comentário aqui: se a tia May tradicional, com tantos problemas de saúde sobrevive há tantos anos e aparentemente está cada vez mais jovem, essa nova versão então...) e Peter é webdesigner do Clarim Diário.

Percebe-se que há por trás destas mudanças a intenção de condensar uma série de acréscimos feitos ao longo de quatro décadas em um todo coerente desde o princípio. Isso faz parte dos trabalhos para tornar os personagens mais “apresentáveis” a novos leitores que não precisam saber por quantas reviravoltas já passou a vida do herói. Ele buscou reunir os elementos mais conhecidos pelos fãs recentes e os conceitos que todos sabem sobre o personagem e construir uma história mais próxima ao que vem na mente de qualquer um quando se fala em Homem-Aranha.

Tanto é assim, que depois de algum tempo, a dupla resolveu ousar bastante e misturar elementos de momentos distantes entre si na cronologia original e fazer uma história que pode ser considerada inteiramente nova, que certamente surpreendeu os leitores veteranos. Alguns, inclusive, que eram considerados puro lixo criativo em suas versões anteriores, como os elementos da Saga do Clone.

O resultado foi uma concentração de vários acontecimentos marcantes para Peter que se combinaram para formar algo maior, um momento de traumas que o fizeram amadurecer como ser humano e herói.

Mas há algo mais profundo por trás da construção de Bendis. Algo que talvez nem todos percebam, porque vêem a linha Ultimate apenas com uma cenário que mais parecido com elementos da vida contemporânea, sem uma outra leitura dos conceitos de super-heróis. Habitando um mundo repleto de heróis nada românticos ou idealistas, o Homem-Aranha é o mais honesto defensor de Nova Iorque.

Em contraste com tudo mais que acontece nas revistas da linha Ultimate, Bendis mostra como o jovem Peter vive sobre o lema de seus poderes e responsabilidades, transformando a célebre frase: "Com Grandes Poderes Vêm Grandes Responsabilidades", em algo muito mais profundo e presente nas histórias do que temos visto nos últimos anos da linha convencional.

 

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