FANTASMA: OS 70 ANOS DE UM ESPÍRITO VINGADOR

O herói clássico de Lee Falk ainda exerce fascínio nos leitores do século XXI

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Ele pode estar sumido nos últimos tempos das bancas nacionais, mas é sempre lembrado por todos aqueles que cultuam quadrinhos como um dos ícones dos super-heróis clássicos, e mostra força suficiente para acabar de fazer nada menos do que 70 anos de sua criação. Trata-se do imortal Fantasma, mais conhecido como “O Espírito que Anda”. E como anda: desde que foi criado, e publicado pela primeira vez, em 17 de fevereiro de 1936, por Leon “Lee” Falk, então um jovem de apenas 25 anos, o Fantasma já correu o mundo inteiro, literalmente, seja em suas aventuras, seja no número de países que já publicaram histórias do personagem, com raras exceções.

Ele foi o primeiro “super-herói” uniformizado de que se tem notícia. Mesmo o mágico Mandrake, outro “super-herói” criado também por Falk, antes mesmo do defensor de bengala, não usava uniforme, apenas vestia sempre seu elegante terno, gravata e cartola, como todo distinto cavalheiro que era. O Super-Homem surgiria em 1938, sendo seguido depois por Batman, Capitão América, e toda a sorte de heróis que conhecemos até hoje. Pode-se dizer que foi o pioneirismo do Fantasma que abriu as portas para todos eles.

Não demorou para o personagem obter fama com suas histórias, tendo chegado ao Brasil ainda naquela década, sendo publicado em suplementos de jornais, como o extinto A Gazeta, e na antiga revista Gibi. A partir do início dos anos 1950, agora com revista própria, o personagem seria publicado regularmente até o início dos anos 1990, na antiga Rio Gráfica e Editora (RGE, atual Editora Globo). Depois que a Globo cancelou praticamente todas as suas revistas de super-heróis, iniciou-se uma fase de aparições irregulares de personagem que dura até os dias atuais, sendo que as últimas edições nacionais do personagem saíram já faz quase 5 anos, e de lá para cá praticamente nada se fez para reeditar o Fantasma no Brasil.

Mas, se em nosso país os leitores estão órfãos do personagem, nos Estados Unidos o Fantasma vem ganhando recentemente um bom tratamento da editora Moonstone, que tem editado uma revista regular do personagem, além de oferecer as sagas em formato encadernado para os leitores mais exigentes. Indagados sobre quais foram os quesitos necessários para se conseguir os direitos de publicação do herói de Lee Falk, Joe Gentile, da Moonstone Comics, apenas resumiu numa palavra: persistência.

Segundo Gentile, as histórias publicadas pela Moonstone não tem nenhuma seqüência de continuidade com as tiras diárias do personagem, produzidas pela King Features Syndicate, proprietária do personagem, e responsável pelo material que é distribuído para publicação em jornais do mundo inteiro. A editora ainda publica compilações das tiras dominicais em edições especiais, permitindo que os leitores possam apreciar também este tipo de material. Segundo Gentile, não há como planejar nada conjunto com o time que cuida das tiras de jornal, razão pela qual não foi feito nada especial que fizesse coincidir qualquer lançamento visando o aniversário do personagem nas tiras de jornal.

Chuck Dixon, roteirista do título regular na Moonstone, define o Fantasma como um conto de múltiplas gerações de um vigilante misterioso, mascarado que protege as selvas de Bangala, e cujo título é passado de pai para filho. É aventura clássica no melhor sentido da palavra, e para Dixon, isso é o que atrai os fãs do personagem há tantos anos, classificando a criação de Lee Falk de verdadeiramente “imortal”. Já Mike Bullock, que está assumindo a função de Dixon, considera o personagem o super-herói mais antigo a aparecer nos quadrinhos oficialmente, com identidade secreta e tudo: “Ele não ter nenhum poder; apenas confia na sua imaginação, habilidade e força de vontade para superar os inimigos. E tem feito isso durante setenta anos, com carisma, valores e motivações infinitas, e sendo tão atraente hoje como nos antigos anos 1930...”

Para Rafael Nieves, que também roteiriza as edições do herói, o Fantasma começou com um homem à beira de morte, que foi poupado, e renasceu como um símbolo de justiça e proteção, jurando defender as pessoas que o salvaram e o criaram. Embora baseado na África, ele se tornou um justiceiro mundial. A característica mais interessante dele é a idéia que é um ser imortal, com centenas de anos; um fantasma, um espírito de, se não vingança, de justiça. O que faz com que sua fama atravesse o tempo e as gerações. O Fantasma não é o super-herói habitual, que faz uso de seus poderes para trazer justiça ou respeito. Ele é um herói profundamente humano, com limites e contradições. A sua benevolência e determinação são poderosos, junto com os atributos particulares que o fazem misterioso. O herói é na verdade uma linhagem inteira dedicada a combater o crime. Assim como Clark Kent é a identidade secreta do Super-homem, Kit Walker é o disfarce do Fantasma. Em seu reino, ele é visto como algo mítico, porque ele é “O Homem que não morre”. Durante séculos, houve sempre um Fantasma, assim, parece como se ele tivesse realmente vivido centenas de anos, quando na realidade, o Fantasma já são 20 gerações de filhos do original. Sua existência inteira é focalizada em ser um instrumento de justiça, e ele é tanto venerados quanto temido. Sua mística de imortalidade é algo único entre os super-heróis e, muitas vezes, o temor que o Fantasma incute em seus inimigos é muito pior para eles do que enfrentar o próprio Fantasma.

Segundo a Moonstone, o maior desafio é como manter o personagem atraente para o público atual, o que se consegue mantendo o foco do personagem fiel à sua verdadeira essência como conceito de personagem, ao mesmo tempo em que o colocam em novas situações, sempre com boas histórias. Caso contrário, corre-se o risco de estagnar o personagem, o que pode ser fatal para a publicação do título. Para a editora, o fato do Fantasma não desfrutar de maior popularidade hoje, frente a personagens como Batman, X-Men e outros, deriva em parte do péssimo trabalho anterior de algumas editoras, que não fizeram direito a sua lição de casa com o personagem, erros que garantem que a Moonstone não repetirá. A editora está comemorando o aniversário do personagem com o arco Legado, que deverá mostrar a “origem” completa do Fantasma, em uma história que é planejada para agradar a fãs de todas as gerações do herói, algo que muitos nunca viram a fundo até hoje. Outra publicação especial será Lei da Selva (Law of Jungle, no original), uma edição especial em forma de romance gráfico, isto é, não se trata de um gibi, mas de um livro, contando uma aventura do Espírito-que Anda, com ilustrações gráficas, onde o personagem deverá ser observado do ponto de um dos sujeitos “ruins”, o que deve dar uma perspectiva inteiramente nova, bem como um final surpreendente, garante Joe Gentile. Para o romance gráfico, o artista Paul Guinan empregou uma técnica que mistura fotografia, pintura e desenho, de modo que as gravuras ficassem mais naturais e realistas possíveis. Não chega a ser um “Alex Ross”, mas o resultado deve agradar bastante aos leitores.

Outros planos da Moonstone são de aumentar o número de histórias enfocando justamente o “primeiro” Fantasma, algo parecido como Batman – Ano 1, em que o novo justiceiro deverá agir para firmar os primeiros passos do que seria a lenda do Espírito-que-Anda, pois segundo a equipe de produção do título regular, poucas histórias enfocam principalmente este personagem, e muita coisa há para ser contada, especialmente como a lenda do justiceiro “imortal” foi criada naqueles tempos selvagens do século XVI. Um filão para muitas histórias potencialmente boas...

E a editora americana avisa que virão por aí muitas outras histórias, possíveis novos romances gráficos, e está sendo até estudado um novo tipo de publicação, do qual não adiantam detalhes, apenas dizem que os fãs do Fantasma não perdem por esperar. Àqueles que ainda lançam dúvidas sobre a força do personagem, a resposta vem em um dos famosos “ditados da selva” sobre o personagem: “O Fantasma não falha, ele não é encontrado, ele encontra as pessoas”, afirmando que, mais cedo ou mais tarde, os leitores serão “encontrados” pelo herói de Lee Falk.

Apesar de não freqüentar as bancas nacionais há algum tempo, a Opera Graphica, editora que detém os direitos do personagem, planeja sim comemorar os 70 anos do Fantasma. Foram programados os lançamentos de duas obras especiais visando ao “aniversário” do “Espírito-que-Anda”: O primeiro deles é o álbum O Fantasma - Sempre aos Domingos, publicação que terá o formato consagrado das publicações feitas com O Príncipe Valente (26 x 35,5 cm) e que irá publicar as primeiras páginas dominicais de O Fantasma, nunca antes reunidas em um único volume no Brasil, com exceção de uma ou outra, em capítulos, nas décadas de 1930 e 1940. Já o outro especial será O Fantasma - Biografia Oficial e, como o nome diz, será uma verdadeira “biografia” do personagem, contando com uma edição volumosa, coordenada por Franco de Rosa e com edição de Roberto Guedes, a partir de pesquisa de Marco Aurélio Lucchetti, também seu principal redator. A edição desse livro ainda contará com a colaboração de diversos convidados, como Gonçalo Junior, Nobuyoshi Chinen, Luiz Sampaio, Iramir Ribeiro, Marcelo Naranjo, J.J. Marreiro, Marcus Ramone, entre outros. Ainda publicará depoimentos de Julio Shimamoto, Airon, Oscar Kern, Verde, Primaggio Mantovi, Rodolfo Zalla, Sidney Gusman e outras feras especializadas em quadrinhos. O único empecilho é que a editora ainda não anunciou quando as duas publicações saem, o que já deveria ter acontecido, uma vez que a data comemorativa foi no mês de fevereiro 2006.

(*) é colaborador autônomo de jornais e revistas especializadas na área de quadrinhos, animação e afins.

 

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